quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

ALÉM DO BEM E DO MAL - 21

 
A aspiração ao livre arbítrio (metafísico superlativo) fez o lógico criar a monstruosidade matemática chamada causa em si para depois poder se iludir, orgulhoso, com ela. Essa ilusão nada mais é do que o desejo do homem em ser essa causa primeira, tomar a inteira e última responsabilidade dos seus atos – como alguém que realmente acredita ser capaz de puxar a si mesmo pelos cabelos para sair do pântano do nada e entrar na existência –, aliviando, assim, Deus, o universo, os antepassados, o acaso e a sociedade.

No em si não há elos causais, necessidades ou ausência de liberdade psicológica. Nele, o efeito não segue a causa, não há lei alguma. Nós é que criamos as causas, a sucessão, a reciprocidade, a relatividade, o constrangimento, o número, a lei, a liberdade, a motivação e a finalidade. Daí a possibilidade da imagem de alguém erguendo a si mesmo pelos cabelos. Porém, sempre que misturamos nas coisas este mundo de sinais como se existisse um em si, não procedemos senão mitologicamente – como sempre procedemos.

De fato, o par de contrários livre arbítrio/vontade não livre é uma mitologia, pois na vida real apenas se trata de vontade forte e vontade fraca. Aquele que se vê desejando sair de uma situação de vontade não livre para uma de livre arbítrio, trai a si mesmo. Essa traição oscila entre dois prismas diferentes e extremamente íntimos: a responsabilização por tudo, por um lado e, por outro, a não responsabilização por nada. Esses são os fracos de vontade.

Nota-se, porém, que o fatalismo dos fracos de vontade se embeleza espantosamente quando eles aprendem a apresentá-lo como uma religião do sofrimento humano. A isso chamam de bom gosto.
  

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