quarta-feira, 17 de junho de 2009

MEU PRIMEIRO ROTEIRO: MÁ COMPANHIA?

Eis o link para o meu primeiro ROTEIRO!

"MÁ COMPANHIA?"

STORYLINE:
Para conquistar homem desconhecido em palestra sobre "O pensamento vivo de Freud", mulher jovem precisa descobrir como lidar com as manifestações inconscientes do seu próprio desejo.

http://www.roteirodecinema.com.br/roteiros/ma_companhia.pdf

quarta-feira, 10 de junho de 2009

SOCIEDADE SOCIALISTA, ARTE ANARQUISTA


A idéia que o jovem Marx tinha do papel do escritor exige, em nossos dias, uma retomada vigorosa. É claro que essa idéia deve abranger também, no plano artístico e científico, as diversas categorias de produtores e pesquisadores:

"O escritor, diz ele, deve naturalmente ganhar dinheiro para poder viver e escrever, mas não deve em nenhum caso viver e escrever para ganhar dinheiro . . . O escritor não considera de forma alguma seus trabalhos como um meio. Eles são objetivos em si, são tão pouco um meio para si mesmo e para os outros que sacrifica, se necessário, sua própria existência à existência de seus trabalhos . . . A primeira condição da liberdade de imprensa consiste em não ser um ofício".

Mais que nunca é oportuno agora brandir essa declaração contra aqueles que pretendem sujeitar a atividade intelectual a fins exteriores a si mesma e, desprezando todas as determinações históricas que lhe são próprias, dirigir, em função de pretensas razões de Estado [ou de Mercado], os temas da arte. A livre escolha desses temas e a não-restrição absoluta no que se refere ao campo de sua exploração constituem para o artista um bem que ele tem o direito de reivindicar como inalienável. Em matéria de criação artística, importa essencialmente que a imaginação escape a qualquer coação, não se deixe sob nenhum pretexto impor qualquer figurino. Àqueles que nos pressionarem, hoje ou amanhã, para consentir que a arte seja submetida a uma disciplina que consideramos radicalmente incompatível com seus meios, opomos uma recusa inapelável e nossa vontade deliberada de nos apegarmos à fórmula: toda licença em arte.

Reconhecemos, é claro, ao Estado revolucionário o direito de defender-se contra a reação burguesa agressiva, mesmo quando se cobre com a bandeira da ciência ou da arte. Mas entre essas medidas impostas e temporárias de auto-defesa revolucionária e a pretensão de exercer um comando sobre a criação intelectual da sociedade, há um abismo. Se, para o desenvolvimento das forças produtivas materiais, cabe à revolução erigir um regime socialista de plano centralizado, para a criação intelectual ela deve, já desde o começo, estabelecer e assegurar um regime anar quista de liberdade individual. Nenhuma autoridade, nenhuma coação, nem o menor traço de comando! As diversas associações de cientistas e os grupos coletivos de artistas que trabalharão para resolver tarefas nunca antes tão grandiosas unicamente podem surgir e desenvolver um trabalho fecundo na base de uma livre amizade criadora, sem a menor coação externa.

Do que ficou dito decorre claramente que ao defender a liberdade de criação, não pretendemos absolutamente justificar o indiferentismo político e longe está de nosso pensamento querer ressuscitar uma arte dita"pura" que de ordinário serve aos objetivos mais do que impuros da reação. Não, nós temos um conceito muito elevado da função da arte para negar sua influência sobre o destino da sociedade. Consideramos que a tarefa suprema da arte em nossa época é participar consciente e ativamente da preparação da revolução. No entanto, o artista só pode servir à luta emancipadora quando está compenetrado subjetivamente de seu conteúdo social e individual, quando faz passar por seus nervos o sentido e o drama dessa luta e quando procura livremente dar uma encarnação artística a seu mundo interior.

(trechos de "Por uma arte revolucionária independente", de André Breton e Diego Riviera, escrito em 1938)

Nota: a retórica normativa é típica dos discursos permeados por debates ferrenhos nascidos de antagonismos profundos quanto aos rumos sociais do planeta. Será que hoje, apesar da "liberdade" que se diz socializada, os antagonismos são menos profundos?

segunda-feira, 8 de junho de 2009

ALGUMA TRADIÇÃO: GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ

Gabriel García Márquez: Sim, acredito: em geral, um escritor só escreve um único livro, embora esse livro apareça em muitos tomos, com títulos diversos. É o caso de Balzac, de Conrad, de Meleville, de Kafka e, naturalmente, de Faulkner.

Plinio Apuleyo Mendonza: Se não é o livro de Macondo, qual seria esse livro único seu?

GGM: O livro da solidão.
PAM: Se a solidão é o tema dominante de todos os seus livros, onde se deveria procurar a raiz desse sentimento dominante?

GGM: Acho que é um problema de todo mundo. Cada um tem as suas maneiras e os seus meios de expressar isso. Muitos escritores, alguns sem perceber, não fazem outra coisa senão expressar isso na sua obra. Entre eles eu.

PAM: Depois de O enterro do Diabo e antes de Cem anos de solidão (Ninguém escreve ao coronel, Veneno da madrugada e Os funerais da mamãe morta) seus romances e contos se tornaram de repente realistas, sóbrios, muito rigorosos na linguagem e na construção e sem nenhuma magia nem exagero. Como se explica essa mudança?

GGM: Quando escrevi O enterro do diabo já tinha a convicção de que todo bom romance devia ser uma transposição poética da realidade. Mas aquele livro, como você se lembra, apareceu num momento em que a Colômbia vivia uma época de perseguições políticas sangrentas e meus amigos militantes me criaram um terrível complexo de culpa. "É um romance que não denuncia, que não desmascara nada", disseram. Esse conceito vejo hoje como muito simplista e equivocado, mas naquele momento me levou a pensar que eu devia me ocupar da realidade imedata do país, afastando-me um pouco das minhas idéias literárias iniciais que por sorte acabei recuperando. Corri, entretanto, um sério risco de quebrar a cara. Estes foram livros inspirados na realidade da Colômbia e sua estrutura racionalista é determinada pela natureza do tema. Não me arrependo de tê-los escritos, mas constituem um tipo de literatura premeditada, que oferece uma visão um tanto estática e excludente da realidade. Por melhores ou piores que pareçam, são livros que acabam na última página.

PAM: O que fez você mudar de rumo?

GGM: A reflexão sobre o meu próprio trabalho. Uma longa reflexão, para compreender finalmente que o meu compromisso não era com a realidade política e social do meu país, mas sim com toda a realidade deste mundo e do outro, sem preterir nem menosprezar nenhum dos seus aspectos. (...) Como você sabe muito bem, nas minhas opções políticas pessoais sou um homem comprometido, politicamente comprometido. (...) Quero que o mundo seja socialista e acredito que mais cedo ou mais tarde será. Mas tenho muitas reservas contra ao que entre nós se deu em chamar literatura comprometida, ou mais exatamente romance social, que é o ponto culminante dessa literatura, porque me parece que a sua visão limitada do mundo e da vida não serviu, politicamente falando, de nada. Longe de apressar um processo de tomada de consciência, o retarda. (...) Muitos amigos militantes se sentem frequntemente obrigados a ditar normas aos escritores quanto ao que se deve ou não se deve escrever, assumem, talvez sem perceber, uma posição reacionária, na medida em que estão impondo restrições à liberdade de criação. Acho que um romance de amor é tão válido quanto qualquer outro. Na realidade, o dever de um escritor e o dever revolucionário, se quisermos, é o de escrever bem.

PAM: Quem foi o melhor leitor do livro Cem anos de solidão para você?

GGM: Uma amiga soviética encontrou uma senhora muito idosa copiando todo o livro à mão, coisa que naturalmente fez até o final. Minha amiga perguntou por que fazia isso e a senhora respondeu: "Porque quero saber quem na realidade está louco: se é o autor ou se sou eu, e acho que a única maneira de saber é tornando a escrever o livro."

PAM: Cem anos de solidão vendeu menos na França que na Inglaterra ou na Itália, para não falar nos países de fala espanhola, onde o sucesso foi obviamente extraordinário. A que atribui isso?

GGM: Talvez ao cartesianismo. Estou muito mais próximo das loucuras de Rabelais que dos rigores de Descartes. Na França foi Descartes quem se impôs.


(Transcrição feita com adaptações de trechos. "Cheiro de Goiaba")