certa vez houve uma mulher que enfiou a cabeça dentro do forno
o terror se torna por fim quase
suportável
mas nunca completamente
o terror se arrasta como um gato
rasteja como um gato
na minha mente
posso ouvir a risada das massas
elas são fortes
elas sobriverão
como a barata
nunca tire seus olhos da barata
você não voltará a vê-la outra vez.
as massas estão em todo lugar
sabem como fazer as coisas
elas têm raivas sadias e mortais
por coisas sadias e
mortais.
gostaria de estar dirigindo um Buick 1952 azul
ou um Buick 1942 azul-marinho
ou um Buick 1932 azul
sobre um desfiladeiro do inferno e em direção ao mar.
(Charles Bukowski)
....................................................................
barata
a barata rastejou
sobre os ladrilhos
enquanto eu estava mijando e
ao virar minha cabeça
ela enfiou o traseiro
numa fenda.
peguei o inseticida e disparei o aerossol
e disparei e disparei
e finalmente a barata saiu
e me lançou um olhar muito nojento.
então desabou dentro
da banheira e fiquei assistindo à
sua morte com um prazer sutil
pois eu pagava o aluguel
e ela não.
recolhi-a com
um tipo de papel higiênico
azul-esverdeado e joguei-a
na descarga, era tudo o que se
tinha a fazer, exceto que
nas redondezas de Hollywood e
Western temos que seguir
fazendo isso.
dizem que em algum dia essa
tribo herdará
a terra
mas faremos com que
esperem mais
alguns meses.
(Charles Bukowski)
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
SAIDEIRA
Ela lê, lê, lê e lê.
Obstinada e de pé.
Toma de assalto a autonomia dos meus olhos vermelhos.
Vontade de ser um texto interessante, escrevo,
como se fizesse à ilustre desconhecida
uma confissão patética de amor sincero.
Um cara se aproxima.
Gestos e palavras.
Assunto insondável.
Ela, enfim, põe de lado o livro
e, no rosto, um sorriso.
Dou mais um gole na minha cerveja
e maldigo meu estúpido coração.
Obstinada e de pé.
Toma de assalto a autonomia dos meus olhos vermelhos.
Vontade de ser um texto interessante, escrevo,
como se fizesse à ilustre desconhecida
uma confissão patética de amor sincero.
Um cara se aproxima.
Gestos e palavras.
Assunto insondável.
Ela, enfim, põe de lado o livro
e, no rosto, um sorriso.
Dou mais um gole na minha cerveja
e maldigo meu estúpido coração.
sexta-feira, 9 de dezembro de 2011
O VELHO NO BARRIL
O cachorro caga, mas não faz cara de nojo.
E nisso é candidato ao futuro das grandes civilizações.
O Sol nos ilumina e esquenta a todos.
Mas não dispensa, ao meio-dia,
uma lamparina
para o encontro com o homem de verdade.
O mundo inteiro
é um homérico escarro de gente rica.
Mas em suas casas, cuspir,
só se for em suas caras.
Alexandre que vá desatar seus nós górdios
e me deixe em paz
com aquilo que não pode me dar!
E nisso é candidato ao futuro das grandes civilizações.
O Sol nos ilumina e esquenta a todos.
Mas não dispensa, ao meio-dia,
uma lamparina
para o encontro com o homem de verdade.
O mundo inteiro
é um homérico escarro de gente rica.
Mas em suas casas, cuspir,
só se for em suas caras.
Alexandre que vá desatar seus nós górdios
e me deixe em paz
com aquilo que não pode me dar!
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
COISAS QUE POUCO ENVELHECEM
Liguei para ela.
Me fiz de maioral.
Achava que precisava
(e você sabe, a verdade insiste em não passar de opinião).
Sempre acho que preciso, é ridículo.
Talvez por isso, por ser ridículo,
seja tão necessário e verdadeiro.
Eis a minha opinião.
Então é isso, o puto ia de maioral na comédia sem cura e com graça apenas para os loucos:
- Não vou dizer que te amo, mas quero que você ouça com os meus ouvidos.
- Respeito suas opiniões, só não admito que discorde de mim.
- Essa sua maldita necessidade de ser escrotizada faz de mim um escroto prestativo de mérito duvidoso.
que ela não havia dado a menor bola.
Porque era realmente SUPERIOR.
Ou talvez porque, simplesmente,
não sabia fingir.
(Malditos poetas
que fingem ser sombras
só pra enxergarem no escuro!)
Liguei novamente,
Ela, autêntica, também foi.
Fomos e nos despedimos.
Temporariamente desiludido e me sentindo
um pouco menos condenado
por simplesmente estar.
Me fiz de maioral.
Achava que precisava
(e você sabe, a verdade insiste em não passar de opinião).
Sempre acho que preciso, é ridículo.
Talvez por isso, por ser ridículo,
seja tão necessário e verdadeiro.
Eis a minha opinião.
Então é isso, o puto ia de maioral na comédia sem cura e com graça apenas para os loucos:
- Não preciso de você e você sabe disso.
- Sou dono do meu nariz, mas meus defeitos são todos seus.- Não vou dizer que te amo, mas quero que você ouça com os meus ouvidos.
- Respeito suas opiniões, só não admito que discorde de mim.
- Essa sua maldita necessidade de ser escrotizada faz de mim um escroto prestativo de mérito duvidoso.
Desliguei.
Nem reparei,
no silêncio do meu esgoto cristão a céu aberto,que ela não havia dado a menor bola.
Porque era realmente SUPERIOR.
Ou talvez porque, simplesmente,
não sabia fingir.
(Malditos poetas
que fingem ser sombras
só pra enxergarem no escuro!)
Liguei novamente,
humano, falho e tolo.
Fui doce e patético.Ela, autêntica, também foi.
Fomos e nos despedimos.
Desliguei e sorri.
Irresistivelmente comovido e solitário.Temporariamente desiludido e me sentindo
um pouco menos condenado
por simplesmente estar.
FORMAS NA ESCURIDÃO
Eram duas da madrugada.
Duas e quinze.
Despertei com o som do telefone, acho.
Deitado no sofá da sala escura,
eu acordado e a campainha do telefone soando
pareciam duas coisas realmente estranhas.
Depende de qual lado do cérebro acordou primeiro.
assustadoramente assustada e dissimulada,
sofrendo e contendo o próprio sofrimento
e fazendo sofrer e conter e sofrer,
disse:
Você está bem?
Responda!
dizia estar passeando pelo cemitério
e que havia muitos mortos e mais mortos e mais mortos
e depois chorava e chorava e chorava.
dormindo no sofá da sala e completamente alheio
a estórias de horror.
O pesadelo era ter acordado.
Desliguei.
- Haveria, algum enigma que se recusa à luz do dia, manifestado sua mensagem infernal pelo serviço telefônico com tarifa reduzida?
- Seria uma mãe cobrando do seu filho que siga pelo caminho da luz que leva diretamente à prisão do seu útero empoeirado?
o telefone tocou novamente.
Porra, será que é alguém com a minha voz dizendo que eu estou no cemitério cheio de mortos?
Atendi, tomado de medo e fascínio e alguma irritação de sobreaviso.
Era minha mãe, novamente.
Disse que a minha voz tinha acabado de ligar para ela, de novo,
desesperada e chorando no cemitério com medo dos mortos.
Bem, dessa vez ao menos, eu sabia que não havia sido eu.
a me ligar no meio da madrugada foi realmente emitida por ela?
Duas e quinze.
Despertei com o som do telefone, acho.
Deitado no sofá da sala escura,
eu acordado e a campainha do telefone soando
pareciam duas coisas realmente estranhas.
Então, tudo piorou,
ou melhorou.Depende de qual lado do cérebro acordou primeiro.
Uma voz grave
de zelo e reprimenda,assustadoramente assustada e dissimulada,
sofrendo e contendo o próprio sofrimento
e fazendo sofrer e conter e sofrer,
disse:
Está tudo bem com você?
Aonde você está?Você está bem?
Responda!
A voz familiar me disse que, antes de me ligar, havia acabado de atender a um telefonema
e nele alguém com a minha vozdizia estar passeando pelo cemitério
e que havia muitos mortos e mais mortos e mais mortos
e depois chorava e chorava e chorava.
Respondi, então, que estava em casa
(não tão são, talvez menos são do que salvo, talvez não)dormindo no sofá da sala e completamente alheio
a estórias de horror.
O pesadelo era ter acordado.
Desliguei.
Mas, devo confessar,
a escuridão da sala me deixou uma suspeita de dúvida.
- Teria sido eu que liguei, enquanto fingia pra mim mesmo que dormia?- Haveria, algum enigma que se recusa à luz do dia, manifestado sua mensagem infernal pelo serviço telefônico com tarifa reduzida?
- Seria uma mãe cobrando do seu filho que siga pelo caminho da luz que leva diretamente à prisão do seu útero empoeirado?
- Ou ainda, apenas um trote? Tão estúpido quanto as perguntas que suscita?
Enquanto curtia aquele medo e assombro sonâmbulos,
bem no ventre daquela escuridão sobrenatural,o telefone tocou novamente.
Porra, será que é alguém com a minha voz dizendo que eu estou no cemitério cheio de mortos?
Atendi, tomado de medo e fascínio e alguma irritação de sobreaviso.
Era minha mãe, novamente.
Disse que a minha voz tinha acabado de ligar para ela, de novo,
desesperada e chorando no cemitério com medo dos mortos.
Bem, dessa vez ao menos, eu sabia que não havia sido eu.
Porra, mas se a voz parecia ser a minha,
quem garante que a voz que eu acreditei ser da minha mãe a me ligar no meio da madrugada foi realmente emitida por ela?
Estranha mania essa que as criaturas noturnas têm
de redesenhar, ao próprio bel prazer,
suas formas na escuridão.
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NOITE MAIS NEGRA
Pronto: chegou a noite mais negra.
Porque em verdade existem várias gradações.
Tem um momento em que a noite é televisão,
barulho de talheres, jogo de cartas...
Tem uma hora em que a noite é abajur aceso.
Mas sempre seguindo a galope
na direção última
- a que me encontro agora.
Converso com po espírito de meu pai.
Ele me dá conselhos, põe a mão na minha cabeça,
olha para mim com saudades e se vai.
Queria tanto lhe fazer outras perguntas...
Mas vem chegando a manhã.
e com ela, a poesia se vai.
(Rogério Skylab - "Debaixo das rodas de um automóvel")
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NOITE MAIS NEGRA
Pronto: chegou a noite mais negra.
Porque em verdade existem várias gradações.
Tem um momento em que a noite é televisão,
barulho de talheres, jogo de cartas...
Tem uma hora em que a noite é abajur aceso.
Mas sempre seguindo a galope
na direção última
- a que me encontro agora.
Converso com po espírito de meu pai.
Ele me dá conselhos, põe a mão na minha cabeça,
olha para mim com saudades e se vai.
Queria tanto lhe fazer outras perguntas...
Mas vem chegando a manhã.
e com ela, a poesia se vai.
(Rogério Skylab - "Debaixo das rodas de um automóvel")
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